O depoimento do ex-ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) na Superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba no sábado (2) pode não ser tão danoso ao governo de Jair Bolsonaro como se esperava.
Segundo informações de Rubens Valente, do UOL, Moro disse aos investigadores que não acusou Bolsonaro de um crime e que esse juízo caberá às "instituições competentes". Para o ex-juiz, aquilo que narrou na coletiva de despedida do dia 24 e às autoridades no último final de semana mostra uma interferência política - a tentativa do presidente Bolsonaro de influenciar em alguns trabalhos da PF. Porém, evitou fazer qualquer acusação direta a Bolsonaro.
A opinião de Moro contraria a análise de advogados ouvidos pela imprensa ao longo dos últimos dias. Alguns deles enxergaram crimes de responsabilidade, falsidade ideológica, advocacia istrativa e até obstrução de Justiça que Bolsonaro pode ter cometido (e ível de impeachment) ao exigir ter o a relatórios da PF e pedir a cabeça do então delegado-geral Maurício Valeixo, aliado de Moro.
Moro também se esquivou de explicar sobre pressões do Planalto, em 2019 para o trocar o então superintendente da PF do Rio de Janeiro, o delegado Ricardo Saadi.
A tática de Moro de amenizar a falar sobre possíveis crimes cometidos por Bolsonaro também pode ser uma estratégia do ex-juiz de se defender de uma acusação futura contra ele próprio feita pelo governo.
TRECHOS DO DEPOIMENTO DE SERGIO MORO À POLÍCIA FEDERAL EM CURITIBA
Na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba no Estado do Paraná, onde presente se encontrava CHRISTIANE CORREA MACHADO, Delegada de Polícia Federal, Matr. 10.568, Chefe do Serviço de Inquéritos da Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado - DICOR, e WEDSON CAJÉ LOPES, Delegado de Polícia Federal, lotado no SINQ/DICOR, compareceu Sergio Fernando Moro. RESPONDEU:
QUE tomou conhecimento pela imprensa sobre a determinação do Ministro Celso de Mello sobre a sua oitiva, tendo se colocado à disposição para prestar declarações, informando o fato à Polícia Federal;
QUE perguntado sobre sua definição sobre interferência política do Poder Executivo em cargos de chefia no âmbito da Polícia Judiciária, respondeu que entende que seja uma interferência sem uma causa apontada e portanto arbitrária;
QUE durante o período que esteve à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, houve solicitações do Presidente da República para substituição do Superintendente do Rio de Janeiro, com a indicação de um nome por ele, e depois para substituição do Diretor da Polícia Federal, e, novamente, do Superintendente da Polícia Federal no Estado do Rio de Janeiro, que teria substituído o anterior, novamente com indicação de nomes pelo presidente;
QUE, durante sua gestão, apenas concordou com a primeira substituição, pois, circunstancialmente, o Superintendente do RJ, RICARDO SAAD, havia manifestado interesse de sair, por questões familiares, e a sua troca já estava planejada pelo Diretor Geral, sendo nomeado um nome com autonomia pela própria Polícia Federal, o que garantia a continuidade regular dos serviços de Polícia Judiciária;
QUE na sua gestão preservou a autonomia da Polícia Federal, em relação a interferência política e pediu demissão no dia 24 de abril de 2020, com o mesmo objetivo;
QUE durante a sua coletiva ocorrida em 24 de abril de 2020 narrou fatos verdadeiros, cujo objetivo era esclarecer os motivos de sua saída, preservar autonomia da Polícia Federal, da substituição de Diretor e de Superintendentes, sem causa e com desvio de finalidade, como reconhecimento posteriormente pelo próprio Supremo Tribunal Federal em decisão proferida no dia 29 de abril que suspendeu a posse do DPF ALEXANDRE RAMAGEM;
QUE perguntado se identificava nos fatos apresentados em sua coletiva alguma prática de crime por parte do Exmo. Presidente da República, esclarece que os fatos ali narrados são verdadeiros, que, não obstante, não afirmou que o presidente teria cometido algum crime;
QUE quem falou em crime foi a Procuradoria Geral da República na requisição de abertura de inquérito e agora entende que essa avaliação, quanto a prática de crime cabe às Instituições competentes;
QUE em agosto de 2019 houve uma solicitação por parte do Exmo. Presidente da República de substituição do Superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, RICARDO SAAD;
QUE essa solicitação se deu de forma verbal, no Palácio do Planalto;
QUE não se recorda se houve troca de mensagens sobre esse assunto;
QUE não se recorda se alguém, além do declarante e do Exmo. Presidente da República tenha presenciado essa solicitação;
QUE no entanto, reportou esse fato tanto ao Diretor da Polícia Federal, MAURÍCIO VALEIXO, como ao Dr. SAAD;
QUE os motivos dessa solicitação devem ser indagados ao Presidente da República,
QUE, após muita resistência, houve, como dito acima, concordância do Declarante e do Dr. VALEIXO, com a substituição;
QUE o presidente, após a concordância, declarou publicamente que havia mandado trocar o SR/RJ por motivo de produtividade;
QUE para o Declarante não havia esse motivo e a própria Polícia Federal emitiu nota pública, informando a qualidade do serviço da SR/RJ, o que também pode ser verificado por dados objetivos de produtividade;
QUE só concordou com a substituição porque o novo SR, CARLOS HENRIQUE foi uma escolha da PF e isso garantia a continuidade regular dos serviços da SR/RJ e a própria Polícia Federal informou na nota acima que ele seria o substituto;